segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O futebol do Nordeste agoniza

Do site Estadão

Por Anelso Paixão

Sport e Náutico na Série A, Campinense, ABC e Fortaleza na Série B. O Nordeste perdeu de uma só vez cinco representantes nas duas principais divisões do País. Para amenizar, comemorou o acesso do Ceará da Série B para a A e ainda de Icasa (CE) e Asa (AL) da C para a B. De qualquer forma, uma perda considerável para um futebol que sofre sucessivamente com a redução de espaço no cenário nacional e com crises financeiras que parecem sem solução.

Por muito pouco não perdeu outro, bastante tradicional: o Bahia, dono de uma das maiores e mais fanáticas torcidas do Brasil (a 13ª, segundo pesquisas CNT/Sensus e Ibope). Rebaixado para a Série B em 2003 e para a Série C em 2005, o time conseguiu retornar à B em 2007 e sofreu para se manter nela neste ano.

Em comum, além da crise, os times do Nordeste têm uma reclamação: a distribuição desigual de recursos por parte da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). E com alguma razão. O contrato da entidade com a TV Globo, que transmite o Campeonato Brasileiro, é de R$ 600 milhões, podendo chegar a R$ 1 bilhão com pay-per-view e placas de publicidade. Alguns clubes da Série A, como Corinthians, Flamengo, São Paulo e Palmeiras, recebem R$ 30 milhões. O Vasco, como disputou a Série B este ano, teve direito a 50% (R$ 15 milhões). Os outros ganham a partir deste valor, em ordem decrescente. Já para a Série B, o contrato é de R$ 14 milhões, que são distribuídos entre 18 clubes (Vasco e Guarani, que fazem parte do Clube dos 13, recebem valores diferentes). Cada um fica com R$ 700 mil, pagos em sete parcelas de R$ 100 mil.

"Se continuar neste ritmo, até a Copa de 2014 não vai ter mais nenhum time do Norte e Nordeste nas duas principais divisões do Campeonato Brasileiro. Aí, não tem sentido construir belos estádios aqui", afirma Lúcio Bonfim, presidente do Fortaleza, agora na Terceira Divisão nacional.

A opinião é compartilhada pelo presidente do Sport, Silvio Guimarães, novo integrante da Segunda Divisão. "A disparidade financeira é enorme. Outro dia disse para o presidente do Vitória (clube baiano), que se continuar assim, em breve o Brasileiro vai virar uma reedição do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o Robertão, só com clubes do Sul e Sudeste e um ou outro esporádico do Nordeste."

O presidente do Náutico, outro recém-rebaixado para a Segunda Divisão, concorda. "A divisão da receita penaliza os clubes do Norte e Nordeste. Temos de trabalhar com orçamento muito enxuto para conseguir equilibrar as forças com os times de outras regiões", diz Maurício Cardoso. "Durante três anos nos mantivemos na Primeira Divisão, mas com muita dificuldade, lutando para não cair, sempre no limite."

O dirigente revela outro detalhe que complica a vida dos times da região. "A CBF oferece a diária de um dia e não paga alimentação nos hotéis em que nos concentramos para os jogos do Brasileiro. Como a distância é grande, algumas vezes precisamos viajar um dia antes, e aí o custo fica alto para o clube."

FALTA FÔLEGO

Além da questão financeira, os clubes nordestinos tentam também encontrar explicação em campo para seus insucessos. Um dos motivos apontados pelos dirigentes é o tempo de duração do Campeonato Brasileiro na fórmula atual, a dos pontos corridos. "Fica impossível brigar pelo título. Nos pontos corridos, um time precisa ter um plantel muito forte, porque são muitas contusões e suspensões. Então, com nosso orçamento, é inviável equilibrar forças com os times do Sudeste", afirma o presidente do Sport. "No mata-mata, ao menos podemos usar a força de nossa torcida e de nosso estádio. Só assim é possível brigar até o fim. Não vou dizer que é a fórmula ideal, mas o mata-mata é a nossa única esperança."

Para o dirigente, uma competição tão longa quanto o atual Campeonato Brasileiro se torna desgastante para os times que são obrigados a viajar mais. "Aconteceu isso com o Sport nesta temporada. Primeiro disputamos o Estadual e simultaneamente a Libertadores. Depois, veio o Brasileiro e, como a maioria dos times é das regiões Sul e Sudeste, foram muitas viagens. No final da temporada, percebemos um desgaste muito grande de nossos atletas."

PATROCÍNIOS MODESTOS

Conquistar patrocinadores é outra dificuldade. "Quando conseguimos um patrocínio de camisa na casa de R$ 4 milhões, como neste ano, achamos que é o máximo. Os times de São Paulo falam em R$ 20 milhões, no mínimo (o Corinthians acabou chegando a R$ 32 milhões com a soma de todos que expuseram sua marca na camisa). E olha que é muito raro conseguir o valor que conquistamos este ano. É que foi uma temporada atípica, com Libertadores e tudo."

O Fortaleza, que recentemente abocanhou os títulos cearenses de 2000 a 2005, e depois ainda de 2007 a 2009, e agora amarga a Série C do Brasileiro, viveu situação inversa. "Perdemos um patrocinador que nos apoiou por nove anos. Era mais que um patrocínio, porque, além do valor mensal que a empresa nos dava, sempre nos ajudava quando precisávamos de uma contratação ou de algum investimento", explica Lúcio Bonfim. Em função disso, de acordo com o dirigente, a folha de pagamento teve de ser reduzida de R$ 650 mil em 2008 para R$ 330 mil nesta temporada. "É claro que isso reflete em campo, mas enfrentamos também outros problemas. Tivemos quatro técnicos no campeonato, o que não é bom."

Já o Ceará sonha escrever um capítulo diferente em sua volta à elite nacional após cinco anos - disputou a Série A pela última vez em 1994. "Nada é por acaso. Reformamos o estádio, construímos sala de imprensa, centro de fisiologia, academia e passamos de 1,5 mil sócios-torcedores para 13 mil. A luta, agora, é para sobreviver entre os grandes."

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